quinta-feira, 29 de maio de 2008

Por Paulo Leminski

Poesia
Vende-se
Um livro de literatura (seja lá o que isso queira significar) é a mais singular das mercadorias. Quando compra uma caixa de sabão em pó, você sabe que, no mínimo, aquele produto vai deixar sua roupa mais branca, uns mais, outros menos. No caso do livro de literatura, a situação é bem diversa. Ao comprar um romance, você quase não sabe nada sobre ele. Será emocionante? Será tedioso? Quem sabe, um grande romance, mas para outras pessoas que não eu. Os riscos aumentam extraordinariamente quando você compra um livro de poemas. Aí sim você está no mato sem cachorro. No início do século, não, você pisava em terreno seguro. Poesia era caixinha de bombons chamada soneto, um pedaço bem cortado de frases enfeitadas, que emitia sempre o mesmo plim. Como um canário na gaiola ou uma caixinha de música. Nos tempos de Bilac (final do século XIX), você sabia o que comprava. Nos anos 20 (do século XX), os modernistas de São Paulo, influenciados por doutrinas alienígenas, dinamitaram a central elétrica. E, em lugar do verbo agradar, passaram a conjugar o verbo agredir. De lá pra cá, as coisas se tornaram nebulosas. A literatura era uma certeza e uma tranqüilidade. O Modernismo transformou em problema. De agora em diante, cada escritor tem que viver, em si mesmo, todo o processo da literatura, de Homero até o best-seller de ontem à tarde. Os mapas se perderam. As pistas foram apagadas. E as tábuas de lei voltaram ao pó donde vieram. As ordens voltaram ao caos primordial. Não há mais normas. Cada um está condenado a ser o próprio legislador. E ao confeccionar sua própria receita, programar, sozinho, seu próprio processo de criação. Ser o único responsável pelo software da sua produção. Ao contrário do que dizem, a poesia concreta paulista, nos anos 60, ampliou ainda mais o indeterminado dessa liberdade, sabe Deus se bênção ou maldição. Liberdade de escrever no plano e até no volume (e não mais apenas na linha). Liberdade de construir novos vocabulários, novas grafias, novas sintaxes. Não há outro jeito. A crise virou substância. Poesia viva, hoje, é a que já nasce se perguntando: - Poesia, ah, poesia, que diabo isso quer dizer? (Por falar nisso, alguém aí quer comprar a minha crise?)

terça-feira, 27 de maio de 2008



curto meu silêncio


meu espaço


meu quarto


meu mundo particular




quarta-feira, 21 de maio de 2008





sexta-feira, 16 de maio de 2008



De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Por Christine Ferreira

Classificados
procuro
um homem bom
sensível leitor de Drummond
que leve café na cama
e diga todo dia que me ama
que veja comigo filme francês
e diga que gostou, só pra ser cortês
que depois da briga não vá embora
e nunca faça xixi fora
que corte as unhas do pé
sem religião, mas que seja homem de fé
não precisa ser bonito
mas ache nosso amor infinito
um pouquinho só sofisticado
imprescindível: homem estudado
que eu seja a mulher de sua vida
que me ouça,cure minha ferida
que goste de literatura
e ache mal de amor não tem cura
que por mim esteja sempre faminto
mas não me pergunte a idade, que eu minto
que queira viver um amor de novela
desses de livro de donzela
como nos filmes de Hollywood
onde o mocinho nunca ilude
não sei
se esse homem existe
não faz mal
minha busca persiste
mas com certeza
não viverei amargurada
não sou mulher de cama e mesa
e antes só que mal acompanhada

sábado, 10 de maio de 2008

Passagem das horas (Fernando Pessoa)

Poder rir, rir
rir despejadamente,
rir como um copo entornado,
absolutamente doido só por sentir,
absolutamente roto por me roçar
contra as coisas,
ferido na boca por morder coisas,
com as unhas em sangue por
me agarrar a coisas,
e depois dêem-me a cela que quiserem
que eu me lembrarei da vida
.